Mariana de Camargo Cleto
Psicóloga – CRP 08/18459
Especialista em Saúde Mental
Especialista em Atendimento Educacional Especializado
A adolescência se constitui em um dos períodos mais conturbados da vida do ser humano. Neste período, é difícil definir o limite entre o que é normal e patológico. Por mais estranho que pareça, o que entendemos por normal neste momento é exatamente a anormalidade de comportamentos presentes. Nesse sentido, precisamos considerar que é anormal haver um equilíbrio durante o processo de desenvolvimento da adolescência.
O adolescente passa por desequilíbrios e instabilidades extremas neste período de vida, o que se convenciona chamar de "síndrome normal da adolescência". Esta fase é essencial para o adolescente, mesmo que perturbadora para o adulto, pois neste processo estabelece a sua identidade.
Esta síndrome surge da interação do adolescente com o seu meio, pois o adolescente não existe isoladamente. Em razão da crise essencial da adolescência, esta idade é a mais apta para sofrer os impactos de uma realidade frustrante.
Neste processo, o adolescente realiza três lutos fundamentais: o luto pelo corpo infantil perdido; o luto pelo papel e a identidade infantis, que o obriga a uma renúncia da dependência e a uma aceitação de responsabilidades que muitas vezes desconhece; o luto pelos pais da infância, procurando o refúgio e a proteção que eles significam, situação que se complica pela própria atitude dos pais, que também têm que aceitar o seu envelhecimento e o fato de que seus filhos já não são crianças. Ou seja, neste momento, o adolescente precisa desligar-se de seu mundo infantil com o qual vivia de forma prazerosa e enfrentar o mundo dos adultos para o qual não está totalmente preparado.
O adolescente apresenta uma vulnerabilidade especial para assimilar os impactos projetivos de pais, irmãos, amigos e de toda a sociedade. Torna-se uma “esponja”, se encarrega dos conflitos dos outros e assume os aspectos mais doentios do meio em que vive. Isto é o que percebemos em nossa sociedade, que projeta suas próprias falhas nos assim chamados excessos da juventude.
A severidade com que os adultos pretendem reprimir os jovens só cria um distanciamento maior e uma aumento dos conflitos, com o desenvolvimento de personalidades e grupos sociais cada vez mais anormais. São comuns, nesse momento, as crises religiosas e comportamento social reivindicatório.
O adolescente pode não perceber que está mudando e que seus pais e sociedade não lhe permitem uma atitude provedora e protetora. Esta constitui a base para uma atitude social reivindicatória.
O fenômeno grupal adquire uma importância significativa na adolescência, pois o adolescente transfere para seus pares parte da dependência que mantinha de sua família. Os valores do grupo chegam, inclusive, a ser escravizantes.
Outro aspecto importante a ser abordado é que o quadro de violência ao qual nos deparamos na sociedade, não oferece aos adolescentes garantias suficientes de sobrevivência e, em sua busca por ideais de identificação, pode também ver como recurso a violência e o poder.
Seu esforço por tentar controlar as tendências destrutivas pode levar a uma paralisação, da qual só consegue escapar por meio da ação impulsiva, expressando sua luta entre vida e morte. Num bom desenvolvimento, a aceitação da vida conduz também à aceitação da morte.
Frente à angústia que traz o desenvolvimento da identidade no adolescente, pode surgir a busca por uma identidade totalitária, como se o fato de ser alguém e alguém mau ou morrer por livre escolha fosse melhor do que ser "mais ou menos alguém ... ". .
Nesse sentido, o desejo de morrer se torna presente neste processo de desenvolvimento e explica as fantasias suicidas nos adolescentes, bem como suas crises em relação à morte. Vale considerarmos que este desejo de morte pode chegar a um ato de suicídio real. Nestes casos, ser um suicida pode se transformar numa escolha de identidade para os adolescentes.
De acordo com as pesquisas mais recentes, sabemos que o suicídio tem sido considerado a segunda maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos. Diante desse cenário alarmante, enquanto cuidadores e conviventes, necessitamos treinar a nossa identificação para sinais de alerta e fatores de risco, os quais elevam as chances de um suicídio vir a acontecer.
Entre os sinais de alerta nos adolescentes, podemos destacar: irritabilidade, agitação excessiva, tristeza, baixa autoestima, sentimento de impotência, relatos de violência ou negligência, falta de suporte social, comportamentos autolesivos e tentativas prévias de suicídio.
Também precisamos ter atenção quanto aos fatores de risco presentes na vida do adolescente como, por exemplo: tentativas prévias de suicídio, histórico de suicídio na família, transtorno mental, doença crônica, exposição à violência, abuso de substâncias, perdas significativas, falta de suporte social e dificuldade de acesso a serviços de saúde mental.
Sendo capazes de perceber esses aspectos, precisamos reconhecer e fortalecer os fatores de proteção para o adolescente, sendo alguns deles: os bons vínculos afetivos, a sensação de pertença a um grupo ou comunidade, um bom suporte social, a capacidade de adaptação positiva, as crenças religiosas ou espirituais, a capacidade de resolução de problemas, os hábitos saudáveis e objetivos de vida.
Por fim, é preciso sabermos conduzir este momento da vida de forma mais adequada e empática. Neste sentido, o papel dos cuidadores é fundamental, pois a sua postura diante dos adolescentes será decisiva para a frequência dos sintomas da Síndrome da Adolescência Normal.
Se você está enfrentando esse sofrimento ou conhece alguém que esteja, procure ajuda em sua unidade de saúde, hospital geral, CAPS ou através do telefone 188 (Centro de Valorização da Vida).
REFERÊNCIAS:
ü ABERASTURY, A; KNOBEL, M. Adolescência normal: um enfoque psicanalítico. Porto Alegre: Artmed, 1981.
ü Fiocruz disponível no site: www.portal.fiocruz.br
ü Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)/Organização Mundial da Saúde (OMS) Brasil disponível no site: www.paho.org/bra
ü Setembro Amarelo disponível no site: www.setembroamarelo.com